A solidariedade pressupõe mudanças
estruturais que transformem nossa sociedade e nos possibilite um futuro
sustentável. A solidariedade é formada quando comprometemos
nossa vida, nosso tempo, nossos conhecimentos e nossa vontade de mudar
uma sociedade de que não gostamos, por outra mais humana e mais
justa.
Do mesmo modo que a queda do muro de Berlim surpreendeu aos especialistas
e aos profissionais do meio, é provável que essa nova revolução
esteja acontecendo apesar de que não a percebamos.
Os acontecimentos mais importantes a favor da dignidade humana, como as
grandes religiões ou o movimento obreiro, foram iniciativas solidárias
de voluntários que arriscaram suas vidas e apostaram pela utopia
gratuitamente e se entregaram aos outros. O que sufocou seus sinais de
identidade e sua capacidade de persuação foi a burocracia
política ou eclesiástica.
A recuperação de suas origens passa por recriar o voluntariado
e reinventar aqueles processos os quais na tradição obreira
se chamava militância e autogestão e, na tradição
eclesiástica, compromisso e entrega, como disse García Roca
em "Solidariedade e Voluntariado".
Esta forma de voluntariado social, ao contrário de outras formas
igualmente importantes de ajuda aos demais, nasce da experiência
da solidão e da consciência da injustiça social que
leva a uma responsabilidade solidária. O Estado de Bem-Estar Social
debilitou a tradição do voluntariado ao fingir que os poderes
públicos eram os únicos sujeitos da vida social, que a relação
de trabalho era a única valorizada e que os especialistas passavam
à ação competente nascida da iniciativa cidadã.
Tudo ficava sobre o controle da administração do mercado.
Quando o Estado se considera mais que um instrumento a serviço
da sociedade, esta sofre a intromissão daquele e corremos o perigo
de que padeçam os direitos naturais dos cidadãos - que não
emanam de nenhuma instituição, mas são parte do indivíduo.
O que mais cabe aos órgãos da administração
do Estado é o reconhecimento, a promoção e a garantia
dos mesmos junto a terceiros e junto a si mesmo. Ou seja, o modelo de
crescimento que atribui o Bem-Estar Social ao Estado é injusto
e se tornou insustentável. Devemos buscar modelos alternativos
ao falso dilema "capitalismo selvagem" ou "socialismo de
Estado". Onde as estruturas são injustas, o direito à
resistência se converte em um dever, e ao não exercê-lo
nos transformamos em cúmplices de suas conseqüências.