Reflexo de realidades

São utilizadas em rituais de muitos povos para expressar o que as palavras não alcançam. As máscaras dançam porque o ritmo é o ponto de encontro entre o espaço e a eternidade. É impossível se aproximar ao mistério sem o ritmo, e sem os pés descalços. Por isso, os povos se enfeitam, pintam o rosto; bebe o pajé a bebida sagrada, e se entregam a ebriedade do frenesi que atua como catarse. Ciclo de nascer, viver, morrer e ressuscitar mediante símbolos visíveis de realidades invisíveis. Transcendem-se os limites e, em plena liberdade, balbucia-se uma linguagem inédita.
Os não-iniciados falam de inalienação e até em extravagância. Piores são as alienações que imponem a sociedade entre globalizadores e globalizados.
As máscaras não servem para esconder o rosto, mas para ser muitos ao mesmo tempo e por sua vez o mesmo. Seus traços de animais, de plantas, de nuvens e de monstros servem para exorcizar e descobrir-se outros, e para descobrir-se alguém, e para descubrir-se todo.
As máscaras são espelhos nos quais se reflete a aparência para que estale em mil arestas de realidade oculta.
As máscaras não são boas nem más, nem bonitas nem feias; expressam o horror da liberdade aprisionada, da inocência perdida, que iluminará uma nova inocência com o despertar do mais autêntico.
A ocultação tende à transfiguração, a facilitar o transpasse do que é ao que se quer ser, dimensão mágica da máscara. A máscara equivale a crisálida de uma nova personalidade.
Nesta seção, escolheremos ser a bigorna antes que o martelo. Mas tiraremos faíscas dos golpes que diariamente caem sobre as pessoas, sobre os povos e sobre um meio ambiente que não suporta mais agressões. Seremos esse grito, essas mãos que se levantam, esse reflexo de uma realidade truncada e que já carece de sentido porque perdeu sua harmonia.
Estas máscaras refletirão a realidade que as culturas, os sistemas e os modelos impuseram. Pois acreditamos que é possível a esperança, arremessamo-nos ao caminho aberto a todos os ventos e a todas as sortes; assumindo riscos porque, em tempos de mudanças, a rebeldia é uma das dimensões fundamentais do ser humano. Há urgencias essenciais. O indígena como realidade e metáfora do globalizado, a mestiçagem desejável mais que inevitável. Para que nossos filhos não nos desvalorizem, porque podendo tanto nos atrevemos a tão pouco.

José Carlos Gª Fajardo

Este artículo fue publicado en el Centro de Colaboraciones Solidarias (CCS) el 12/04/2004